Em 22 de setembro de 2020, a 6ª Vara Federal de Guarulhos proferiu decisão liminar determinando a imediata liberação de mercadorias retidas sob a fiscalização fiscal, sem necessidade de caução, uma vez que as suspeitas levantadas pela autoridade fiscal não foram aptas para autorizar a instauração de um Procedimento Especial de Controle Aduaneiro (IN RFB 1.169/2011), ou seja, não há que se falar em infração punível com o perdimento, concluindo pela ilegalidade da retenção.
A demanda teve como objetivo a
liberação de mercadorias que estavam sob a fiscalização fiscal por eventual subfaturamento
e suspeitas de ocultação do real adquirente, tendo em vista que a autoridade
fiscal não observou os métodos de valoração aduaneira previstos no (AVA-GATT –
Acordo de Valoração Aduaneira, em que o Brasil é signatário), em ofensa a
estrita legalidade, e, por não haver a comprovação das suspeitas aventadas pela
Ré.
Além disso, objetivou a Autora a
deliberação sobre a desnecessidade da anuência da ANVISA para a nacionalização
dos bens, tendo em vista as consultas realizadas pela empresa junto ao órgão
competente, em concordância com legislação pertinente (Resolução de Diretoria
Colegiada – RDC).
Na
decisão, o Juiz Federal primeiramente repisou a desnecessidade da obtenção de
anuência da ANVISA para a liberação das mercadorias. Aduz ainda que, somente as
hipóteses que dão ensejo à aplicação da pena de perdimento são aptas a
instaurar o PECA, não podendo a fiscalização obstar a liberação dos bens mesmo
que caucionado o valor alusivo a diferenças tributárias (art. 68 da MP n°
2.158-35 c/c arts. 66 e seguintes da IN SRF 206/2002).
Ademais,
no que diz respeito a levantada suspeita de ocultação do real adquirente pela
autoridade fiscal, o magistrado entendeu que as suspeitas manifestadas pela
fiscalização não apresentavam substrato jurídico e/ou fático para autorizar o
procedimento excepcional em questão, sobretudo quando tal medida tem o drástico
efeito de permitir a retenção das mercadorias importadas por período de até 180
dias.
Ao
analisar os documentos trazidos nos autos, o Juiz Federal verificou que a
suposta terceira empresa que teria participado da negociação, nada mais é do
que uma marca de sua própria titularidade, conforme registro junto ao Instituto
Nacional de Propriedade Industrial – INPI, concluindo que no caso não há que se
falar em ocultação e nem de interposição fraudulenta.
Explica ainda o magistrado
federal que o risco de irreversibilidade dos efeitos da tutela antecipada a
partir da liberação das mercadorias é mitigado em virtude da possibilidade de
constituição de multa substitutiva ao perdimento, com base no art. 23, V, c/c
§1 e 3°, do Decreto-Lei n° 1.455/1976.
Por fim, para a análise do
subfaturamento aventado pela Fiscalização, entendeu o magistrado que o ponto a
ser decidido seria a liberação das mercadorias mediante a prestação de garantia
ou não, ao passo que a Autoridade Fiscal tem levantado suas suspeitas em
pesquisas na internet, identificando valores substancialmente maiores àqueles
declarados na documentação de importação.
Assim, levantou o juiz federal
o Tema 1042, cujo entendimento vem sendo discutido no STF através do RE
1.090.591 em repercussão geral, no sentido de que é possível condicionar o
desembaraço aduaneiro de bens importados ao pagamento de diferença fiscal
arbitrada por autoridade sobre o valor da mercadoria, tendo sido o entendimento
do ministro do STF Marco Aurélio no sentido da essencialidade do desembaraço
dos bens, mediante o pagamento de tributo e multa, no qual o seu inadimplemento
inviabilizaria a conclusão do procedimento e afastaria a possibilidade da
internalização das mercadorias, contrariando a Súmula 323 até então pacificada
no Supremo.
Contudo, o Juiz Federal explicou
que no caso em discussão é imprópria a técnica levada a efeito pela ré ao
estimar os valores das mercadorias importadas pela Autora, sendo inviável a
aplicação dos valores extraídos das plataformas utilizadas pela Fiscalização,
concluindo o magistrado pela ausência de irreversibilidade vedada pelo art.
300, §3° do CPC, haja vista a possibilidade de multa substitutiva ao
perdimento, bem como de eventual cobrança de diferenças tributárias mediante
utilização dos meios à disposição da Fazenda Pública, autorizando a medida
pleiteada na Inicial.
Ao final, diante da comprovada
probabilidade de direito e somado ao perigo na demora, também em decorrência
dos custos altíssimos de armazenagem em zona aeroportuária, decidiu ser de
rigor a medida antecipatória, determinando-se a imediata liberação dos bens
importados pela Autora.
No caso, o escritório DB Tesser Sociedade de Advogados demonstrou que tanto a legislação como o entendimento jurisprudencial corroboravam com os seus fundamentos para a liberação dos bens.
Para mais informações entre em contato com a nossa equipe!
Decisão Comentada por Rebeca Ayres, Advogada , Formada em Direito em 2017 pela Faculdade Baiana de Direito/BA, especialista em Direito Aduaneiro e Comércio Exterior pela Univali-Itajaí. Área de Atuação: Direito Aduaneiro, Direito Tributário e Direito Marítimo. OAB/BA 57.313 e OAB/SC 52.845.